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Minha palavra é noite,
às vezes é lua cheia,
às vezes minguante
-quase nunca nova
 
O HOMEM E O VIOLÃO
 
Welis Couto
 
O microfone, o banquinho de três pés e o violão. Eis o artista pronto para a sua apresentação. 0 homem e seu violão, mo da lançada com a bossa nova, enchia as casas de espetáculos, e teve adeptos famosos e consagrados, como Toquinho, João Gilberto, Baden Povell, Paulinho Tapajós, dentre outros, que percorriam o pais unicamente acompanhados de seus violões.

0 instrumento, por sua forma arredondada, foi assemelhado à mulher e amado talvez, mais do que ela. É o companheiro inseparável do artista, de todas as horas, dos shows e dos instantes de insônia. Há uma afeição profunda entre o homem e seu violão, em que as cordas conversam com seu interlocutor, respondendo aos impulsos emotivos e mantendo com ele uma conversa harmônica.

Assim o violão se popularizou como um dos mais pretendido dos instrumentos, presente nos botecos, no bate-papo, nas festinhas de amigos. Aulas para aprender a tocá-lo há em todo canto e os métodos de aprendizagem sem mestre existem em quase todas as casas.

Ao mesmo tempo em que o instrumento se popularizou, tornou-se, também, sinônimo de malandragem. O violonista é um malandro, um desajustado que não quer nada com a vida - dizem muitos -, no entanto desconhecem a magia desse instrumento e sua imensa afinidade com o seu possuidor. Talvez, por apresentar menor dificuldade para sua aprendizagem, possuir manejo e transporte fáceis, o instrumento se popularizou tanto.

Com sua forma sensual à mulher, seu longo braço e as cordas afinadas à de um contralto, o violão volta a ser hoje a parte principal do espetáculo.

Abafado pela parafernália musical dos anos 1970/80, com o advento da guitarra elétrica, do órgão e do saxofone, os crescentes conjuntos de rock, o violão passou a ser um som dissonante naquela orquestra desarmônica. Os efeitos especiais de luzes, cores e som, os artistas extravagantes vestidos em trajess berrantes faziam aquilo a que chamavam de “espetáculo”.

No meio dessa insanidade musical, hav.ia os que, pelos cantos, insistiam em levar ao público unicamente a sua voz e do violão.

Alguns acompanhados só por esse instrumento e outros assessorados pela flauta e afins, foram abrindo seus espaços na música. Dessa forma, houve espetáculos como a moça, o poeta e o violão, com Vinícius de Moraes, Toquinho e Clara Nunes, e algumas com o Paulinho da Viola.

Na segunda metade dos anos 1980, o violão voltou à tona. Baden Powell, nome inconteste na arte desse instrumento, com seus espetáculos pelo mundo simplesmente acompanhado pelo violão, prosseguiu com seus shows pelo pais afora. João Gilberto, nesse mesmo ano, com o violão e o banquinho revigoraram a bossa nova, cantando para imensas plateias nos Estados Unidos e na França, com o velho som do Brasil agradando sem limites. E mesmo Caetano Veloso que preferia shous mais movimentados, trocou sua banda pelo violão em grande temporada no Rio e depois  em São Paulo.

Novos artistas foram surgindo e à moda daqueles que acreditaram no talento, na voz e no violão, foram trilhando o mesmo caminho.

Assim, nomes como o do artista prateano Celso Adolfo e Paulinho Pedra Azul, cujo nome já diz a origem, foram ganhando espaço no cenário musical mostrando sua arte e seu violão.

Como eles, muitos outros vão surgindo, e novamente a velha cena volta ao palco e vai-se avultando para arrancar os melhores aplausos do público: um microfone, o banqui nho, o homem e o violão Mas, ainda continuo à espera do tão sonhado espetáculo de João Gilberto, na comemoração de seus oitenta anos.

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